segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Do Significado da Vida ao Elogio da Diferença



Uma das questões a que as pessoas têm mais dificuldade em responder é “Qual o significado da minha vida?”. Todos os dias realizamos inúmeras actividades, desde as rotinas de higiene e alimentação, ao cuidar dos filhos, estacionar o carro, escolher o que vestir, trabalhar, fazer a lista de compras, ver um filme, procurar o telemóvel, aturar a amiga chata, ir ao dentista… em prol de quê? Porque fazemos estas coisas todas? Porque tem de ser. Que seria dos meus filhos se não o fizesse? Tenho que ganhar dinheiro para pagar as contas. Quero ser bem-sucedido. Quero emagrecer. É assim a vida. Temos que ser uns para os outros. Tenho que pagar o empréstimo da casa. Quero ser saudável. As coisas estão difíceis, há que lutar pela vida. Do céu só cai a chuva. E aviões, acrescento eu.

Quantas vezes chegamos ao fim do dia exaustos, fartos, aborrecidos, e, ao reflectir sobre o nosso dia, chegamos à conclusão de que não fizemos nada de jeito? 
Como seria o nosso dia se tivéssemos feito alguma coisa de jeito?

O que é preciso estares a fazer para sentir que andas a fazer alguma coisa de jeito?

É na resposta a esta questão que está uma das principais pistas para o caminho da nossa felicidade individual. Não é o que estamos a fazer, mas o que sentimos quando estamos a fazê-lo que conta. Por mais rotineiro e banal que seja lavar os dentes, se queremos ser saudáveis, é preciso fazê-lo. E se queremos ser felizes, é preciso desfrutar de o fazer.  Procuramos a felicidade em momentos transcendentes, únicos, que nos façam vibrar, sentir a adrenalina de estar vivos. E esquecemo-nos de a sentir nos gestos banais e quotidianos. Porque será?
Num documentário a que assisti defendia-se que tal se deve a um factor psicológico simples: quando algo se torna repetitivo, perdemos o foco da atenção e assim nascem os hábitos mecânicos. Para além disso, os nossos instintos naturais estão programados para reagir a cores brilhantes, sons fortes e outros estímulos repentinos, como forma de alarme para a sobrevivência. Estamos biologicamente condenados a deixar de saborear a vida quotidiana.

Estaremos mesmo? Já observaste os outros animais? Já deste conta da felicidade que o cão manifesta quando, todos os dias às 19 horas, pões a chave na porta de casa? Do abanar veemente da cauda - todos os dias - quando lhe pões a comida na tigela? Os outros animais também estão programados para reagir instintivamente a estímulos repentinos. No entanto, é no dia-a-dia banal e quotidiano, quando tudo está calmo e tranquilo, que os pássaros cantam.

Observa os animais na natureza. Aos estímulos repentinos reagem com medo, fugindo, ou atacando agressivamente. De resto, aí estão, desfrutando. Não perdem o foco da atenção por algo ser repetitivo e rotineiro: desfrutam-no. Alegram-se por estar tudo bem e tranquilo. Alegram-se por não haver nada de novo para fazer. Alegram-se porque o sol aquece e a brisa refresca.
E nós, humanos estranhos e insatisfeitos, sentimo-nos frustrados porque o dia de hoje foi igual ao de ontem. Ficamos cansados por não termos feito nada de diferente. Em que momento deixámos de saborear a rotina? 
Dei comigo a pensar nisto. Como sagitariana que sou, adoro viagens, sejam físicas, mentais, emocionais, espirituais, ao exterior, ao interior, onde quer que possa explorar novas sensações, novos pensamentos, novas emoções. No entanto, descobri com um namorado tipicamente taurino que a segurança da rotina dá uma sensação de tranquilidade, de harmonia, de felicidade… descobrir prazer na rotina foi uma das melhores aprendizagens que fiz nessa relação. Ficou-me inscrito na alma. A simplicidade do dia-a-dia é também uma viagem muito interessante de se fazer. Passei a sentir os aromas, o vento no rosto, as cores do céu, a ida à mercearia, como uma viagem ao momento presente. Não podemos dizer que ir a Londres ou ao Pingo Doce sejam a mesma coisa, claro. Mas aprendi que ambos nos trazem sensações diferentes de satisfação. Não caiamos, porém, no outro extremo, o de deixar que a rotina adormeça os sentidos e o sentir!

Deixamos então de sentir prazer e satisfação no quotidiano não por mecanismos psicológicos relacionados com a atenção, mas pelo significado que atribuímos às experiências.
Essa atribuição de significado depende de inúmeros factores (das experiências anteriores, da educação, da cultura em que se está inserido, entre outros), mas acima de tudo, depende do tipo de diálogo interior que temos connosco mesmos. É por isso que tantas ferramentas hoje nascem por aí, como PNL, coaching, mindfullness, lei da atracção, técnicas de meditação várias, entre tantas e tantas. Já experimentei umas quantas e digo-vos, algumas delas são fantásticas. Resultam mesmo. Quem me conhece, sabe que “respiro” técnicas destas para trabalhar o diálogo interior. Recomendo vivamente que experimentem, que escolham pelo menos uma, de acordo com as vossas ideologias, crenças, preferências. É brutal, a sério.

Mas a verdade é que o motivo pelo qual funcionam também depende do significado que lhes atribuo. No meu caso, essas ferramentas servem para me ajudar a tornar a minha vida um reflexo de quem eu sou. Esse é o valor que lhes dou, o significado que para mim têm e o motivo pelo qual funcionam. Porque nenhuma destas técnicas irá funcionar se se limitarem a aplicá-las mecanicamente. Podem atrair para a vossa vida o necessário para comprar um carro novo, mas não vão ficar mais felizes por isso. Estas técnicas ajudam-nos a serem mais felizes se estivermos a usá-las para alcançar a felicidade. E para o fazermos, precisamos primeiro realizar um trabalho de auto-conhecimento sério, de modo a retirar as várias camadas que temos em cima, de expectativas dos outros, da sociedade e de nós mesmos, e descobrir quem sou eu, o que quero ser, de que gosto em mim. Não é descobrir o que tenho, o que os outros gostam em mim, qual o meu papel na sociedade, como alcançar os meus objectivos. Claro que tudo isso é muito importante! Aliás, essa análise é fulcral nos primeiros passos para a auto-descoberta. Mas, mais importante, é descobrir quem eu sou.  Se não houvesse limites, obrigações sociais, familiares, restrições financeiras, contas para pagar, patrões chatos, colegas insuportáveis, amigos inconvenientes, filhos lindos para cuidar, namorado a pedir atenção, cães para ir passear… quem seria eu? Note-se que a questão não é “quem gostaria de ser”. Esta questão implica sonhar fora de mim, com alguém diferente de quem eu sou. Estamos a rejeitar quem somos ao invés de mergulhar em nós e descobrir quem somos. “Quem sou eu”, sem todas as obrigações, direitos e deveres em que mergulhei ao nascer? Quem sou eu, sem o meu trabalho? Quem sou eu, sem a minha família? Quem sou eu, sem os meus amigos?

Ao descobrir quem somos, para além de todas essas coisas, descobrimos o que realmente queremos para a nossa vida. Podemos assim iniciar o processo de, passo a passo, ir transformando a nossa vida num reflexo de nós mesmos. Mas, mais importante ainda, ao descobrir quem realmente somos, vamos amar cada pedacinho de nós (sim, depois de mergulharmos nas nossas trevas descobrimos a nossa luz, garanto-vos). Ao amar cada pedacinho de nós, lavar os dentes vai ter outro significado, o de estarmos a cuidar de nós, do nosso corpo, o de ser um passo necessário para conseguirmos o objectivo maior de sermos saudáveis. Ir ao supermercado significa que temos os recursos necessários para nos alimentar, que podemos ser gratos, de coração cheio, por termos as necessidades básicas asseguradas (… tantos que o não têm! Abençoada sou!).

Ao sabermos quem somos, sabemos onde queremos ir. Em vez de perseguirmos objectivos que nos foram ensinados a perseguir, perseguimos os nossos objectivos. O nosso dia-a-dia deixa de ser algo cansativo e aborrecido, para ser um conjunto de pequenos passos, pequenos sucessos, em direcção ao que queremos. Atenção: os nossos objectivos, na prática, podem até manter-se. O que muda efectivamente é que só se mantêm se realmente são um reflexo de quem eu sou. Para além disso, neste processo, descobrir certamente muitas coisas em nós que somos e não queremos ser. Ora, aí está mais um objectivo: que a característica X passe a integrar a nossa personalidade! Em vez de deixar de ser quem sou, de lutar contra quem sou, passo a manifestar quem eu sou, a procurar manifestar a melhor versão de mim mesma.

Ao descobrirmos quem somos, vamos deixar de aturar uma série de coisas que aturávamos, vamos perceber que certas relações não têm mais lugar na nossa vida e que fazemos diariamente imensas coisas que afinal nada têm a ver connosco. Mas mais importante, ainda, vamos passar a aturar certas pessoas e certas situações por escolha, e já não por fatalidade. A consciência dessa escolha faz-nos retomar o poder pessoal e a satisfação que advém daí. Deixamos de ser vítimas infelizes, actores no palco da vida, para passarmos a ser os autores da nossa vida.

Ao sermos os autores da nossa vida, cada gesto, cada decisão, cada momento, é uma escolha e não uma repetição mecanizada. Cada escolha é um passo para conseguir manifestar o meu Ser e não uma representação de um papel social. E cada escolha sabe a vitória, vitória sobre nós mesmos e sobre as nossas dores e sombras. Cada escolha passa a ser um momento de celebração… já não é preciso esperar 10 anos até conseguir comprar um carro melhor para sentir que consegui algo. Já não preciso de um carro para manifestar o meu sucesso… o meu sorriso é a melhor manifestação do meu sucesso! ;)

Neste processo, descobri que ser feliz não é um resultado que advém de conseguir algo. Isso é estar feliz. Ser feliz é estar a fazer algo e sentir felicidade por isso. Ser feliz é conseguir sentir o significado maior que cada gesto nosso tem.

Não faças diferente. Sê diferente. Sê tu.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Vou acabar com os males do mundo. Do meu mundo.

Assolada por uma terrível dor cuja origem não se identifica, dei comigo a pensar que se pudesse acabava com a dor no mundo. Se me fosse concedida a possibilidade de acabar com um dos muitos males do mundo, acabava com a dor.

Logo de seguida, lembrei-me que a dor é um sinal de alarme que o nosso corpo nos envia para alertar de algum desequilíbrio ou enfermidade. A insensibilidade à dor é, aliás, considerada uma doença.
Ora, pois, poderia erradicar as doenças. Porém, a verdade é que as doenças são formas de o nosso corpo nos alertar para o facto de estarmos a viver em desarmonia com as leis da natureza, com o ritmo do nosso corpo. E as que não são dessa ordem, como as genéticas, por exemplo, são marcas cármicas que nos permitirão avançar, se assim o entendermos, na nossa evolução espiritual. Para além disso, a sobrepopulação mundial seria um problema bem mais sério do que aquele que temos hoje em dia.

Por falar em doença, podíamos acabar com a indústria farmacêutica. Essa sim, responsável por epidemias sérias e vírus fabricados. A natureza dá-nos tudo o que precisamos para equilibrar o nosso organismo. Porém, a indústria farmacêutica só existe por causa de interesses financeiros. E se acabasse com o dinheiro no mundo? Ah que sonho lindo... Sem dinheiro, não haveria economia nem finanças, não haveria jogo de interesses estatísticos... As pessoas teriam que dar de si e em troca receber do si do outro. Seria uma verdadeira meritocracia. Cada um de nós colocaria os seus talentos ao serviço da comunidade, valorizando o seu mérito pessoal... Sim, eu sei que já houve mundo sem dinheiro e que não se construiu meritocracia alguma, mas será que posso sonhar só um bocadinho? Já que não consigo adormecer, sonho acordada!

Portanto que mal do mundo erradicaria eu? A dor, a doença, o dinheiro... e o mundo continuaria às avessas. Podia acabar com a fome. Ou será que sem fome deixaríamos de cultivar, de trabalhar, de produzir? Tendo nós as necessidades básicas de sobrevivência asseguradas, sabemos bem que a grande maioria optaria por não fazer nada de útil com a sua vida e a vida devassa (seja lá o que isso for, mas não é coisa boa, certamente) grassaria pelo mundo - mais ainda. 

A guerra. Podia acabar com a guerra. Mas que guerras? A guerra, enquanto confronto armado? A guerra económica? A guerra psicológica?  Sim, todas essas. Ora, mas se acabasse com a guerra no mundo continuaria a haver fome, pobreza, doença, dor, sofrimento...

Mais um pouco e concluo que afinal não acabava com nenhum dos males do mundo, pois começa a parecer-me que todos eles são essenciais ao nosso equilíbrio, por mais desequilibrado que o dito seja. Efectivamente, sabemos bem que a condição humana é caracterizada pela dualidade, pelos opostos. Por luz e sombra, amor e ódio, bem e mal, paz e guerra. Não nos saberemos felizes se não tivermos conhecido a infelicidade. Sócrates, na voz de Platão explicou isto há muitos séculos atrás: só conhecemos algo pelo seu contrário.

Será possível que, se me fosse dado o poder de erradicar um dos males do mundo, eu não saberia usá-lo?!

O poder, podia acabar com o poder. A sede de poder, os jogos de poder, o poder poder. Se bem que, na verdade, o poder não é em si um mal. Eu posso fazer mal ao outro, mas também posso fazer-lhe bem. Posso ter o poder de ajudar o outro. E isso não pode ser erradicado, que é uma das poucas salvações que ainda nos resta... o poder! 

E eis que tive uma epifania… os males do mundo têm origem no uso desajustado do poder pessoal. E esse uso desajustado advém da falta de auto-estima. Quem tiver uma boa auto-estima, não precisa de se valorizar desvalorizando o outro, não precisa de se valorizar através de bens materiais, porque se valoriza como é. Quem tem excesso de auto-estima (aquele que se julga mais do que os outros) tem também uma visão deturpada de si, pelo que ama e aceita um Eu que não existe.
Com uma auto-estima e um auto-conceito equilibrados, não precisaríamos de jogos de poder, de armas, nem de adoptar comportamentos auto-destrutivos. O dinheiro serviria como aquilo que foi na sua origem: moeda de troca. E lá se iam as guerras, a pobreza… pois haveria consequentemente justa distribuição de bens e riquezas, uma vez que com auto-estima equilibrada haveria genuína entrega dos nossos talentos e qualidades ao mundo, generosidade, compaixão e altruísmo… E as doenças! A depressão, de que tanto se fala, desapareceria e a maior parte das restantes doenças também, uma vez que a origem destas é principalmente psicossomática.

O mal do mundo com que acabaria seria, então, a falta de auto-estima.


Como não posso mudar o mundo, mas posso mudar o meu mundo…

Patrícia Cruz

Regras da Pat


A inspiração de cada uma delas já não sei de onde veio... entretanto tornaram-se parte de mim!

1. Usa as ferramentas que tens ao teu dispor, agora.

2. Estuda, lê, medita, observa, ouve, sente.

3. Cuida de ti. Não te escondas, nem te exponhas.

4. Sonha. Faz acontecer.

5. Se aprendeste algo, partilha.

6. Na dúvida, escolhe o que te faz feliz.

7. Só tu tens poder sobre ti.

8. A tua maior força está na tua vulnerabilidade.

9. Busca sempre a tua luz interior.

10. Tudo passa.

11. O caminho certo é sempre o caminho do meio.

12. A maior luz nasce do maior sacrifício.

13. Às vezes, é preciso mandar tudo pelos ares, abandonar, partir.

14. Paciência, prudência, persistência.

15. Curtir a vida! Sempre!

16. Aceitação é a maior benção que podemos dar a nós próprios.

17. Fé e confiança - em ti, principalmente.

18. As grandes verdades vêem-se de olhos fechados.

19. Sê a melhor versão de ti mesma.

20. Pára, pondera, avalia, analisa. Com a Alma.

21. Sempre que subires mais um degrau na vida, celebra-o. Se desceres, também.

22. É ao cair no abismo que descobrimos se sabemos voar.


sexta-feira, 27 de junho de 2014

O amor de si mesmo



O amor próprio é o amor de si mesmo.

Amar a si mesmo é o nosso propósito primordial nesta vida. A nossa essência, aquilo que em nós nos caracteriza como humanidade, é o Amor. A capacidade de amar ao outro, de se dar ao outro é uma manifestação desta virtude, mas não é disso que estamos a falar agora. A capacidade de se dar ao outro é muito nobre, mas pode facilmente nascer numa carência, numa falta de amor a si, que nos faz amar ao outro.

Muitas pessoas que põem o outro em primeiro lugar fazem-no, em primeiro lugar, por desamor a si. Porque reconhecem no outro um valor superior ao seu. Porque nascemos numa sociedade que impõe categorias, que nos ensina a conhecer o mundo através de rótulos, prateleiras, categorias, degraus e graus de mais ou de menos. Ensinam-nos que os nossos pais são mais que nós, que os professores são mais que nós, que ser uma boa esposa implica fazer cedências em quem se é, que uma boa mãe se anula em prol dos filhos, que um funcionário de excelência não tem vida pessoal, que uma pessoa de sucesso é aquela que mais tem materialmente e não a que mais é. Ensinam-nos a ter vergonha de nós, de quem somos, das nossas opiniões e convicções. A recalcar para o mais escondido de nós a nossa espontaneidade, a alegria de sermos quem somos, a satisfação por nos realizarmos enquanto pessoas em cada acto simples do dia a dia. À medida que vamos recalcando as nossas características, vamos acumulando frustrações, sentimentos de humilhação, vergonhas e culpas, sonhos e vontades. Acumulamos, acumulamos… e um dia explodimos.

Uns explodem passado muitos anos com atitudes radicais contra si ou contra os outros. Outros adoptam o papel de vítima, outros de carrasco. Outros vão alternando entre um papel e o outro. Há os que vão explodindo, com raiva, com gritos, com argumentos, com “graxa”, com manipulação. Em cada explosão há um grito do Eu. Um grito do “Eu Sou” a tentar Estar neste mundo. Mas, como é uma manifestação mal canalizada, que obedece a impulsos e nasce desses recalcamentos inconscientes, surge como um estalo no rosto de quem está por perto no momento dessa explosão. Às vezes estalo verbal, outras físico, outras emocional. Esta imposição abrupta de quem se é resulta em resistência no outro, em mais uma rejeição, em mais um conflito… e novamente em recalcamento do Eu, em vergonha e culpa de ser quem sou. Quem tem a coragem de dizer não aos pedidos do outro, é rotulado de egoísta. É falta de educação não responder a uma pergunta, mas “perguntar não ofende”, ou seja, é reconhecido socialmente ao outro o direito de pergunta e a nós mesmos o dever de resposta. O outro tem o “direito de” e eu o “dever de”. Nestes casos, a via do não-conflito passa por expor coisas que não queremos efectivamente expor ou por mentir educadamente. Porque recusar responder à solicitação do outro é rude, é egoísta. E assim é com as perguntas efectivas como com quaisquer outras solicitações. Momento a momento, desde o primeiro choro, vamos sendo educados a anular-nos. Vamos recebendo dos outros a mensagem do valor que afinal não temos. Este sistema está tão enraizado que se torna num “é assim que as coisas são” e quem rompe com estas coisas é mais rapidamente rotulado de “rebelde” do que de “visionário”. Uma nova ideia é rapidamente refutada, antes mesmo de ser ouvida.

Por isso, tivemos que vir nascer novamente nesta nova Era em que se grita “Eu!, Eu!, Eu!” um pouco por todo o lado. O grito do Eu foi um grito colectivo e partilhado por pelo menos três gerações, neste momento. Fala-se de individualismo, de egoísmo, de uma sociedade em que é o “salve-se quem puder” que impera. Em que os vizinhos não se cumprimentam, em que mesmo quando esbarramos com o outro, desviamos o olhar e grunhimos com o incómodo, em que aqueles que pedem desculpa pelo encontrão fazem-no sussurrando e andando em frente rapidamente.  As crianças mandam nos pais, desrespeitam os professores, o funcionário “passa a perna” no chefe, a vítima passa a carrasco. A hierarquia de classes sociais foi tão condenada que deixou de existir e… voltámos aos tempos medievais dos Senhores e da plebe.
Mas é assim que somos. Como seres duais que são os seres humanos, encontramos o equilíbrio nos extremos. O grito de Iparanga do Eu passou da anulação para a imposição. Eu sou, eu estou, eu importo, eu tenho valor resultaram em egos inflamados. Conhecendo os dois extremos, começamos a perceber onde está o meio.

O emergir do individualismo “coincidiu” com a igualdade de oportunidades ao acesso aos bens materiais. O Eu sou aprendeu a manifestar-se, mas fê-lo através do Eu tenho. Tal resulta de séculos de anulação do Eu, em que este foi adoptando papéis sociais consoante épocas e culturas, até ao ponto de se perder. O valor do eu reflecte-se nos valores numéricos da conta bancária. Passámos a ter preço e a falar de pessoas em função dos bens que têm. Exemplo claro disso, tão na voga neste momento, é o valor de x milhões de um jogador de futebol. Ou da resposta à questão “quanto ganhas?” resultar num sentimento de orgulho ou de vergonha para quem responde. A resposta à questão “quem és?” é o nome que os nossos pais escolheram para nós e é mais esclarecida explicando a família de origem. A resposta à questão “que fazes da vida?” passa por dizer a nossa profissão, o que fazemos para ganhar dinheiro. Não vejo assim tanta diferença entre os antigos escravos e esta forma subliminar de domínio. São épocas diferentes pelo que estamos a falar de manifestações diferentes, mas manifestações do mesmo, afinal de contas.
Acabamos sempre por ser servos dos outros. 

Agora importa-me um pequeno esclarecimento. Não tem problema nenhum escolher uma profissão, lutar por bens materiais, fazer por nos integrarmos na sociedade. Não somos eremitas, somos seres sociais e estamos ligados uns aos outros até às vísceras mais profundas, pelo que não faz sentido nenhum rejeitar a sociedade de modo radical. Rejeitar as raízes, é rejeitar quem somos, abandonar os outros é abandonar parte de nós! Isso já foi feito de milhares de formas diferentes e o resultado está à vista e não resultou favorável para ninguém.
É o caminho do meio que proponho. Não sou só eu que proponho, é certo. Mas Eu também proponho. O facto de defender o meu ponto de vista é só isso mesmo, uma partilha daquilo que vejo, sem implicar que mais ninguém vê o mesmo, ou que a visão do outro seja inválida.
Este caminho do meio passa por aceitar que já cedemos e que já nos impomos. Agora é preciso aprender a Ser quem somos, integrados onde Estamos. Integrar o Ser e o Estar. O desafio da nova era é este mesmo: aprender a Estar, Sendo. Daí que o auto-conhecimento seja a principal via para a realização pessoal e social. Onde estou? Como estou? Como estas respostas reflectem quem eu sou? E, claro, é preciso responder à questão “Quem Eu Sou?”.
À medida que nos vamos conhecendo, limpando e retirando as várias máscaras que resultam dos papéis que vamos adoptando, vamos começando a conhecer um pouco mais de nós próprios. Vamos aprendendo a amar cada bocadinho de nós, a aceitar cada uma das cicatrizes na alma e o papel que teve na nossa aprendizagem.

Fazemos, estando e estamos, sendo. Grande desafio! Como fazer isso? Como estar? Como ser? Quem sou?

O ponto de partida para o amor próprio é conhecer o próprio. O próprio quem é? Somos medricas, o medo do desconhecido é característica comum. Vamos ter a coragem de nos conhecermos a nós próprios? Vamos ousar amar-nos a nós próprios?

O texto já vai longo, partilharei as minhas aprendizagens sobre o que é isto e como se faz noutro texto.
A ti que leste esta minha partilha até ao momento, a minha gratidão. Aos que não leram, a minha gratidão também.
Eu Sou Patrícia. 

terça-feira, 15 de abril de 2014

O primeiro texto do meu blogue tem de ser especial. Ainda que, por ser o primeiro, seja já especial. Ainda que, por ser, já é. Gostava de dizer algo ao mundo, à humanidade, que fizesse abanar as pessoas a tal ponto que abandonassem medos, pré-conceitos, ideias erróneas, materialismos, fome, ambição desmesurada, guerra, discórdia. Gostava de dar um contributo tal que nos levasse de imediato ao paraíso, com a abertura de consciência para a nossa essência de luz, de amor, de harmonia. Gostava de escrever um texto que nos deixasse a todos alegres, bem-dispostos, de bem connosco e com a vida. Enfim. Sou idealista, acredito nos impossíveis, tenho uma fé imensa no invisível e no inaudível. Sinto em cada célula do meu corpo as vibrações da humanidade, da Mãe Gaia, as minhas. São gritos. Gritos de socorro, gritos de dor, de desilusão. São frustações, humilhações, dores acutilantes. De tal modo acutilantes que parece que vamos morrer. Porque se pode morrer de dor. Porque o sofrimento mata, corrói. Umas vezes, lentamente, outras vezes de repente.
Uma ferida cuida-se, trata-se. As feridas exigem cuidado, exigem tratamento.  As feridas do corpo, as feridas do coração, as feridas da alma... todas se cuidam, todas se tratam, todas se curam. Às vezes, demasiadas vezes, até parece que não, pois é?
Nós somos pássaros de asas partidas. Muitos de nós cegos para as próprias asas. Somos como águias presas num galinheiro, que acreditam ser galinhas e desconhecem seu real potencial. Somos cegos e surdos para nós próprios. Portanto, chego à conclusão óbvia de que não posso escrever um texto que faça cegos verem e surdos ouvirem.
Mas, como em tudo nesta vida, posso partilhar. Partilhar convosco como tenho lidado com os meus gritos, dores, angústias. A partilha tem destas coisas giras: quanto mais se dá, mais se recebe. E, se eu tanto tenho vindo a aprender com as experiências, vivências, reflexões, dos outros, espero poder aqui juntar-me a essas vozes que ecoam por aí. Que gritam, mas que gritam palavras de fé, esperança, sonhos, sucessos, luz, amor, amizade, fraternidade.
Pois é, o texto não é mais especial que nenhum, o texto é. E eu sou mais uma voz, entre tantas. Mas sou mais uma entre tantas que acreditam num mundo melhor, em pessoas melhores. Que acreditam que podem ser melhores hoje do que o que foram ontem.